A Extensão Rural pode ser definida como um serviço de assessoramento a agricultores, suas famílias, seus grupos e suas organizações, nos campos da tecnologia da produção agropecuária, administração rural, educação alimentar, educação sanitária, educação ecológica, associativismo e ação comunitária. Segundo pesquisadores, a Extensão Rural tem a sua origem nos Estados Unidos, após a Guerra da Secessão de 1861, quando a agricultura americana passou da estrutura escravagista à estrutura mercantil e capitalista. Foi oficializada pelo governo americano em 1914, com a finalidade de diminuir os efeitos que o desenvolvimento acelerado das forças produtivas e as mudanças das relações capitalistas geravam nas comunidades rurais. Esse modelo foi exportado para o Brasil (sem uma demanda local, de acordo com estudiosos) e outros países da América Latina, após a Segunda Guerra Mundial, e intensificado com a Revolução Verde, na década de 1970, que preconizava o aumento da produção agrícola com o uso intenso de insumos químicos, de mecanização moderna e
assistência técnica. Em seu trabalho “Extensão Rural – histórico, conceitos e metodologias”, o professor Luis Carlos F. Oliveira, da Faculdade de Agronomia de Lavras (MG), considera que ao contrário de outros países (Estados Unidos mais fortemente), onde o serviço de extensão rural se formou a partir de uma necessidade sentida, no Brasil surgiu, em parte, por influência externa. “Produzidas por pesquisadores norte-americanos, sendo o maior expoente Everett M. Rogers, as teorias de modernização foram na realidade propostas de busca do desenvolvimento por meio do emprego da tecnologia. Rogers (1962) entendia que ‘a essência do processo de difusão é a interação humana na qual uma pessoa comunica uma nova ideia à outra’, o que deu início ao que se convencionou chamar de difusionismo ou difusão de inovações e tecnologia. No Brasil, o difusionismo se arraigou nos planejamentos e procedimentos agrí- colas oficiais, com os pressupostos técnicos tal como foram originalmente concebidos”, explica Abelardo Gonçalves Pinto, engenheiro agrônomo da Divisão de Extensão Rural da CATI, cuja dissertação de mestrado abordou as nuances e transformações da CATI do modelo difusionista para o enfoque participativo.
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No contexto desse modelo difusionista e importado, entre a Extensão Rural e os produtores, segundo diversos autores, era feita de forma unilateral (saber tecnicista do agente de extensão rural levado aos produtores), com difusão de pacotes tecnológicos e crédito rural (supervisionado a partir da década de 1940 e orientado para aplicações econômicas, a partir do final da década de 1960). Entre as definições, encontradas na literatura, que demonstram esse modelo de transmissão de informa- ções, a da Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural (Abcar) resume “Extensão Rural como um processo cooperativo, baseado em princípios educacionais, que tem por finalidade levar diretamente aos adultos e jovens do meio rural, ensinamentos sobre agricultura, pecuária e economia doméstica, visando modificar hábitos e atitudes da família, nos aspectos técnico, econômico e social, possibilitando-lhe maior produção e melhor produtividade, elevando-lhe a renda e melhorando seu nível de vida”.
A primeira experiência de ação muito limitada que funcionou no Brasil, a partir de 1948, era denominada “Trabalhos Cooperativos em Santa Rita do Passa Quatro”, em São Paulo, mantida com recursos de agricultores, da indústria local, da Prefeitura, contribuição da Associação Internacional Americana e com a cooperação das secretarias de Educação e Saúde. Segundo Vicente de Jesus Carvalho, engenheiro agrônomo aposentado da CATI, que também foi professor da Universidade de Taubaté, essa organização exerceu influência na fundação da Associação de Crédito e Assistência Rural (Acar), em Minas Gerais. “Pode-se considerar esse o primeiro serviço efetivo de extensão rural no Brasil. A Acar objetivava estabelecer um programa de assistência técnica e financeira que possibilitasse a intensificação agropecuária e a melhoria das condições econômicas e sociais da vida rural. Depois dela, outras associações foram criadas, formando-se, assim, a Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural (Abcar)”. No Estado de São Paulo, apesar da experiência em Santa Rita do Passa Quatro, as intervenções no meio rural sempre privilegiaram as ações de assistência técnica e o fomento agrícola. Somente com a criação da CATI, em 1967, congregando diversos órgãos da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, busca-se um novo enfoque de atuação: a Assistência Técnica Integral, com destaque ao caráter educacional, representando uma opção extensionista.
A diferença em relação ao modelo anterior de atuação estava, principalmente, na ênfase ao homem rural e não apenas nos produtos agropecuários. “Mas permanecia a ideia de persuadir os agricultores a adotarem novas tecnologias que possibilitassem a modernização da agricultura, com bases no modelo difusionista implementado no final da década de 1950, pelo movimento Rogeriano”, explica Abelardo. Esse enfoque, estritamente tecnológico, somente foi de fato questionado em 1984, no bojo das reformas democráticas e do clamor social, emergentes no final do regime militar. Busca-se, a partir daí, uma nova filosofia de extensão rural, que permita o exercício de uma democracia participativa. Nesse contexto, novos profissionais são contratados pela CATI e inicia-se um amplo programa de formação extensionista. Exemplos de projetos e ações da CATI Ao longo de seus 48 anos, a CATI passou por reformulações que ampliaram sua visão e atuação extensionista junto aos agricultores paulistas. Segundo José Carlos Rossetti, ex-coordenador da instituição, as ações desenvolvidas foram determinantes para a expansão agrícola paulista. “Muito do desenvolvimento agrícola do Estado foi difundido pela CATI, por meio de ações educativas, campanhas e projetos, dentro de um processo de conscientização”.
Nesses anos todos, trabalhos importantes foram realizados nas décadas de 1960, 1970 e 1980, tais como campanha para expansão da soja; Pró-álcool; Pró- feijão; combate à febre aftosa, à peste suína africana, ao cancro cítrico; classificação de produtos agropecuários; produção de sementes básicas; campanha de armazenamento comunitário; difusão da tecnologia do silo subterrâneo; Plano de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira (PDPL); criação do Método CATI de Renovação de Pastagens; Plano de Renovação Cafeeira (o qual promoveu a renovação da cafeicultura em São Paulo, após a grande geada de 1975 que dizimou milhões de pés de café). Para ampliar o alcance das informações, a CATI utilizava intensamente meios de comunicação diversos: rádio (levava ao ar o programa Atualidades Agrícolas, por uma rede de emissoras regionais, que recebeu um troféu da FAO, como o melhor programa agrícola do Brasil); implementou o primeiro programa da TV brasileira voltado ao meio rural (também Atualidades Agrícolas; cuja primeira transmissão aconteceu em 1973, pela retransmissora da Globo de Bauru e, posteriormente, pela TV Tupi); materiais gráficos diversos, carros com equipamentos audiovisuais; revista e jornal.
No final da década de 1990, destacou-se o trabalho com Microbacias Hidrográficas, o qual consolidou um novo enfoque extensionista baseado na participação e no protagonismo dos agricultores.
Caminhos da Extensão Rural em São Paulo
O modelo de São Paulo originou-se nas atividades realizadas com a organização da Secretaria da Agricultura, Comércio e Obras, pelo Decreto n.° 28, de 1/3/1892 (Martins, 1991). Esse modelo tem características específicas porque não teve suas bases estabelecidas na filosofia extensionista exportada pelos Estados Unidos. Em sua dissertação, Abelardo ressalta que a CATI nasce, em 1967, em uma conjuntura na qual a agricultura passa a ter uma dependência do Poder Público Federal, cujas políticas públicas estão voltadas para a intensificação do processo de modernização tecnológica. “Temos uma nova modalidade de assistência: a integral, que compreende assistência técnica educacional; fomento de bens de produção; presta- ção de serviços; inspeção e classificação de produtos e insumos agrícolas; defesa sanitária animal e vegetal. O técnico passa a ser o agente de assistência técnica educacional, tendo o papel de capacitar os agricultores com vistas à solução de problemas agrícolas, empresariais e comunitários. A diferença desse modelo em relação ao anterior reside na ênfase ao homem rural, mas o viés rogeriano está caracterizado ao buscar-se mudanças de atitude e criação de condições para a adoção de novas técnicas que possibilitem a modernização da agricultura”. Em 1998 é definida a Missão da CATI, que aponta para outra metodologia de trabalho: “Promover o desenvolvimento rural sustentável, por meio de programas e ações participativas, com envolvimento da comunidade, de entidades parceiras e de todos os segmentos dos negócios agrícolas”. A partir daí, as ações da instituição ganham um caráter mais voltado para a extensão rural, com uma nova filosofia de trabalho estabelecida na formação de parcerias, englobando novos conceitos: Desenvolvimento Rural Sustentável, Agricultura Familiar, Agroecologia, Desenvolvimento Local e Qualidade de Vida.
Cronologia da Assistência Técnica e da Extensão Rural em São Paulo
1887 – Criação da primeira Estação Agronômica do País. Contratação do cientista e professor alemão Franz Wilhelm Dafert, para conduzir a implantação. Nascia o Instituto Agronômico, de Campinas, cidade escolhida por ser o ponto mais central da atividade da Província de São Paulo.
1892 – Ações dirigidas ao fomento agrícola e para a defesa fitossanitária das culturas.
1900 – Criação de Distritos Agronômicos com inspetores agrícolas que tinham a missão de levantar as necessidades das lavouras, realizar conferências, atender consultas de lavradores, instalar campos de experiências e demonstração. (Pinto, 2000) Época marcada em termos econômicos, políticos e sociais pela hegemonia dos grandes proprietários fundiários. Nessas condições, a orientação à lavoura dirigiase a um público restrito. (Bergamasco,1992)
1911 – Reestruturação da Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Criação da Diretoria da Agricultura composta pelo Serviço de Inspeção e Defesa Agrícola (Sida) e pelo Serviço de Distribuição de Sementes (SDS).
1914 – Criação do ensino itinerante com carros-escola dotados de mostruários de máquinas e instrumentos agrícolas, publicações e sementes para distribuição.
1927 – Diretoria da Agricultura é transformada em Diretoria de Inspeção e Fomento Agrícola (Difa).
1935 – Extinção da Diretoria de Inspeção e Fomento Agrícola. Criação do Departamento de Fomento da Produção Vegetal (DFPV).
1942 – O Departamento de Fomento da Produção Vegetal é incorporado pelo Instituto Agronômico. Por meio dessa fusão, nasce o Departamento da Produção Vegetal (PDV). A função de fomento agrícola passa à Divisão de Fomento Agrícola (DFA).
1942 – São criadas as Casas da Lavoura, que constituíram a base de todo o trabalho de assistência técnica aos agricultores e difusão de tecnologias. (No período de 1927 até 1942 acontece a consolidação da organização da Assistência Técnica oficial à agricultura paulista, de caráter fomentista, articulada com a pesquisa).
1949 – Efetivação do Departamento de Engenharia e Mecânica da Agricultura (Dema), criado em 1947. Com o objetivo de atender às necessidades da agricultura em termos de mecânica, irrigação e drenagem e combate à erosão.
1958 – Criação da Divisão de Assistência Técnica Especializada (Date), com a função de prestar orientação técnica especializada aos profissionais ligados à rede assistencial, com setores de informação no que se refere à comunicação rural e ao planejamento dos programas de assistência técnica, que Oliveira, em obra de 1984, define como “um conjunto de esforços que tem por objetivo aumentar a produção e produtividade do setor agrícola de um país, prescindindo, de certa forma, de considerar o elemento humano como objetivo do processo”.
1960 – Criação do Centro de Treinamento de Campinas (Cetrec).
1967 – Nesse ano, a Secretaria passa por uma reformulação, que promove a centralização de vários de seus departamentos e divisões em três coordenadorias e duas empresas de economia mista, sendo a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Ceagesp) e a Companhia Agrícola Imobiliária e de Colonização (Caic); e as coordenadorias: Coordenadoria de Pesquisa Agropecuária (CPA), Coordenadoria da Pesquisa de Recursos Naturais (CPRN) e Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), instituição responsável pela assistência aos produtores paulistas. A partir desse período, as Casas da Lavoura passam a se chamar Casas da Agricultura.
Autora: Cleusa Pinheiro – Jornalista – Centro de Comunicação Rural (Cecor/CATI) – cleusa@cati.sp.gov.br – Revista Casa da Agricultura